terça-feira, 6 de novembro de 2012

TRADUÇÃO EXCLUSIVA DE PARTE DO LIVRO WALK IN WALK OUT - A JORNADA DO APRENDIZADO EM COMUNIDADE DE MARGARETH WEATLEY - BERKANA INSTITUTE




LIDERANÇA NA ERA DA COMPLEXIDADE

Por muito tempo, muitos de nós tem tido fascinação por heróis.
Talvez, seja o nosso desejo de sermos salvos, nosso desejo de “não fazermos o trabalho pesado”, e de confiar em alguém (outro) para desenrolar as coisas. Constantemente estamos bombardeados por políticos que se apresentam como heróis, que irão resolver tudo e fazer os nossos problemas desaparecerem.
Esta é uma imagem sedutora, uma promessa mágica. E continuamos acreditando. Em algum lugar existe alguém que fará tudo melhor. Em algum lugar existe alguém que é visionário, inspirador, brilhante, digno de confiança e todos nós vamos alegre e voluntariamente segui-lo ou segui-la. Em algum lugar....
Bem é hora de todos os heróis irem para casa, como o poeta Willian Stafford escreveu: E hora de desistirmos destas esperanças e expectativas que somente estimulam a dependência e a passividade e que não nos dão soluções para os desafios que enfrentamos. É hora de parar de esperar por alguém para nos salvar. É hora de encarar nossa verdadeira situação: Estamos todos juntos nessa, todos temos uma voz e precisamos descobrir e encontrar formas de como mobilizar os corações e mentes de todos em nosso próprio ambiente, em nossos locais de trabalho e comunidades.
Por que continuamos esperando por heróis? Parece que assumimos como “corretas” algumas questões:
·      Os líderes tem as respostas. Eles sabem o que fazer.
·      As pessoas cumprem o que os lideres dizem. Os líderes somente devem fornecer bons planos e instruções.
·      Alta margem de risco requer altos índices de controle. Como as situações crescem em níveis de complexidade e tornam-se mais desafiadoras, o poder precisa subir para níveis superiores (para os líderes que sabem o que fazer)
Estas crenças dão origem aos modelos de comando e controle,  modelos estes, reverenciados em organizações e governos em todo o mundo.
Os que pertencem a parte inferior da hierarquia devem submeter-se a uma maior visão e conhecimento dos que estão acima.
Líderes prometem nos tirar desta bagunça e nós, entregamos voluntariamente nossa autonomia individual em troca de segurança.
A única consequência previsível sobre a tentativa dos líderes para ter controle sobre uma situação complexa, até mesmo caótica, é a criação de mais caos.
Estes líderes se isolam com apenas alguns assessores-chave e tentam encontrar uma solução simplista (e rápida) para um problema complexo. E as pessoas os pressionam a fazer exatamente isso.
Todos querem ver o problema desaparecer, gritos de “resolva-os” surgem do público. Os líderes se esforçam para parecer que possuem controle sobre a situação e que tem tudo nas mãos.
Mas as causas dos problemas de hoje são complexos e interligados. Não há respostas simples e nenhum indivíduo isoladamente pode saber o que fazer.
Nós parecemos ser incapazes de reconhecer estas realidades complexas.  Ao invés disso, quando o líder não consegue resolver a crise, a solução é demiti-lo ou demiti-la e procurar o próximo (e mais perfeito) líder. Nós não questionamos nossas expectativas por líderes, não questionamos nosso profundo desejo de termos heróis por perto.

A ILUSÃO DO CONTROLE

A liderança heroica repousa sobre a ilusão de que alguém pode estar no controle. No entanto, vivemos em um mundo de sistemas complexos, cuja existência, por si só, significa que eles são inerentemente incontroláveis. Ninguém está no controle do nosso sistema de alimentação. Ninguém está no controle de nossas escolas. Ninguém está no controle do meio ambiente. Ninguém é responsável pela segurança nacional. Ninguém está no comando!
Estes sistemas são fenômenos emergentes do resultado de milhares de pequenas ações locais que convergem para criar poderosos sistemas com propriedades que podem ostentar pouca ou nenhuma semelhança  com as pequenas ações que lhes deram origem.  Estes são os sistemas que agora dominam a nossa vida. Estes sistemas não podem sofrer mudança por trabalharem no passado, focando somente poucas, simplistas e reduzidas causas. E certamente, estes sistemas, não podem ser alterados pelas mais ousadas visões de nossos mais heroicos líderes.
Se queremos ser capazes  de conseguir que estes sistemas complexos trabalham melhor, precisamos abandonar nossas expectativas de que o líder atue como herói e precisamos convidá-lo a atuar como servidor.
Precisamos apoiar os líderes que sabem que os problemas são complexos, que sabem que, para compreender a complexidade de qualquer problema, todas as partes do sistema precisam ser convidadas para participar e contribuir. Nós, como liderados, precisamos doar nosso tempo, perdão e paciência e estes  líderes e precisamos estar dispostos a nos dedicarmos e a contribuir.
Estes líderes-servidores são sinceros o suficiente para admitir que muitas vezes, não sabem o que fazer pois tem consciência de que é pura tolice centralizar a busca de respostas somente neles. Mas eles também sabem que podem confiar na criatividade de outras pessoas e em seu compromisso para começar o trabalho a ser feito. Eles sabem que outras pessoas, não importam aonde elas estejam na hierarquia organizacional, podem ter tanta iniciativa, motivação, criatividade e inteligência assim como o líder, dado o convite certo.

A JORNADA DO HERÓI PARA SERVIDOR

Líderes que caminham de heróis para servidores já passaram pela dinâmica negativa da política e da oposição entre níveis hierárquicos. Eles ignoraram os organogramas e as descrições de funções que confinam o potencial das pessoas. Em vez disso, eles se tornaram curiosos. Quem está nesta organização ou comunidade? Que habilidades ou capacidades eles poderiam oferecer se fossem convidados para o trabalho verdadeiramente  como cooperadores, inteiramente como contribuintes? O que eles sabem?  Que percepções eles tem que podem conduzir a uma solução para os problemas?
Líderes-servidores sabem que as pessoas de boa vontade apoiam ações e projetos onde puderam desempenhar um papel na criação, onde puderam participar. Não é possível esperar que as pessoas entrem e participem em planos e projetos dos quais não participaram.
Líderes-servidores investem em conversas significativas entre as pessoas de muitas partes do sistema como a forma mais produtiva de gerar novos conhecimentos e possibilidades de ação. Eles acreditam e confiam que as pessoas estão dispostas a contribuir, e de que a maioria das pessoas anseiam por encontrar sentido e novas possibilidades em suas vidas e no seu trabalho.
Estes líderes sabem que a realização do grupo é  a única forma de solucionar difíceis problemas complexos.
Líderes-servidores não somente de forma benéfica permitem que as pessoas cresçam e confiam que as pessoas farão um bom trabalho inclusive em sua liderança. Apesar de também terem muitos desafios, atividades e coisas para atender, eles comportam-se de forma distinta de um herói.
Os líderes-servidores:
·      Fornecem condições e bons processos de grupo para que as pessoas trabalhem juntas;
·      Fornecem recursos de tempo, a “mercadoria” mais escassa de todas
·      Insistem em que as pessoas e o sistema aprendem, com frequência,  com a experiência;
·      Oferecem apoio inequívoco às pessoas que sabem que o líder está a seu serviço;
·      Mantem a burocracia afastada, criando oásis onde as pessoas possam estar menos sobrecarregadas pelas demandas administrativas insensatas (relatórios e documentos).
Defendem-se e argumentam com outros líderes que querem tomar de volta o controle, ou que os criticam por estar dando muita liberdade às pessoas.
Fornecem feedback regularmente sobre como as pessoas estão fazendo o que estão fazendo durante todo o processo de realização.
Trabalham com as pessoas para desenvolver medidas e indicadores de desempenho importantes para o progresso, para que suas realizações sejam visíveis.
Valorizam o convívio e a presença nos grupos que realizam atividades compartilhadas.

DESAFIOS DE SUPERIORES

É importante notar como líderes que caminham de heróis para servidores dusam o poder de sua posição.
Eles trabalham todos os níveis da hierarquia. Na maioria das vezes é mais fácil ganhar o apoio e respeito das pessoas que o acompanham do que obter este reconhecimento dos seus superiores. A maioria dos líderes seniors de grandes hierarquias acreditam em sua inerente superioridade, comprovada pelas posições que alcançaram. Eles não acreditam que as pessoas comuns são tão criativas ou auto-motivadas como eles. Quando a participação é sugerida como meio para reunir insights e ideias das pessoas sobre um problema complexo, lideres heróis muitas vezes irão impedir ou bloquear tais atividades.
Eles justificam sua oposição, afirmando que as pessoas podem utilizar esta oportunidade para tirarem vantagem da organização, ou que podem sugerir ideias que não tem relação com a missão da empresa, ou ainda que as pessoas, ao se sentirem muito confiantes, podem ultrapassar seus papéis. Na verdade, muitos líderes enxergam o envolvimento de todo o sistema como uma ameaça ao seu próprio poder e controle. Eles consistentemente escolhem o controle e o caos resultante, ao invés de convidar as pessoas para resolverem juntas problemas difíceis e complexos.
Os líderes que sabem o valor do engajamento total, que confiam nos que estão ao seu redor, tem que defender a sua equipe dos líderes que insistem na necessidade de mais controle e mais burocracia para restringirem suas atividades, mesmo quando suas formas de funcionamento produzem excelentes resultados.
É estranho dizer mais muitos líderes escolhem o controle ao invés da eficácia, pois estão dispostos a arriscar a criação de mais caos, continuando sua liderança comando-controle.

RE-ENVOLVER AS PESSOAS

Aqueles que foram prejudicados em papéis de confinamento, que de alguma forma foram enterrados na hierarquia, acabarão por florescer e desenvolverem-se na companhia de um líder-servidor. No entanto é preciso tempo para que os funcionários acreditem que este gestor é diferente e que este líder realmente quer que eles contribuam.
É possível levar de 12 a 18 meses em sistemas onde as pessoas foram silenciadas na submissão de uma liderança autocrática. Neste tempo, a maioria das pessoas esperam para ver atitudes concretas, muitas vezes não estão interessadas por que convites passados não foram sinceros, ou não os envolvia em um trabalho significativo.
O líder precisa provar através de constante insistência que o trabalho não pode ser realizado e os problemas não podem ser resolvidos sem a participação de todos.
Se a mensagem for sincera e consistente, as pessoas gradualmente retornam à vida, mesmo que alguns já estejam “mortos” no trabalho, esperando apenas a aposentadoria, estes, podem renascer, na presença de um líder que incentiva e que cria oportunidades para que todos contribuam.

Líderes servidores precisam ser habilidosos organizadores. Eles percebem que a sua organização ou comunidade é rica em recursos, e que a maneira mais fácil de descobrir estes recursos é unir as  pessoas em torno de diversas conversas significativas, que importam.  As pessoas que não gostam um do outro, as pessoas que se vingam e ignoram o outro, as que se sentem invisíveis, negligenciadas, deixadas de fora, excluídas são as que podem surgir a partir de suas “caixas”e “rótulos” para tornarem-se interessantes, colegas engajados e cidadãos.
Hospedar conversas significativas não significa fazer as pessoas gostarem uma das outras ou se sentirem bem. Trata-se de criar os meios para solução de problemas, de uma forma que contribua para que as equipes funcionem bem e para que as pessoas participem com energia. Líderes-servidores criam uma mudança substantiva, confiando no comprometimento, criatividade e generosidade de todos.
Eles aprendem a partir da experiência que estas qualidades estão presentes em quase todo mundo e nas organizações. Eles estendem sinceros convites, fazendo boas perguntas e tendo a coragem de apoiar a experimentação e os riscos calculados.
Muitos de nós podemos ser pegos agindo como heróis, não de forma consciente, mas a partir de nossas boas intenções e vontade de ajudar. Você está agindo como um herói?
Veja como saber: Você está agindo como um herói quando você acredita que se você apenas trabalhar mais, irá concertar as coisas; que se você apenas ficar mais esperto ou aprender uma nova técnica você vai ser capaz de resolver o problema dos outros. Você está agindo como herói se assumir mais e mais projetos e causas se tiver menos tempo para os relacionamentos. Você está atuando como herói se você acreditar que pode salvar a situação, a pessoa, o mundo. Nossos impulsos heroicos frequentemente nascem da melhor das intenções. Nós queremos ajudar, queremos resolver, queremos corrigir. No entanto esta é a ilusão de excepcionalidade. De que somos os únicos que podem oferecer ajuda, serviço, habilidades. Se não fizermos isso, ninguém o fará. Este caminho herói tem apenas um destino garantido – acabam sentindo-se solitários, exaustos e desvalorizados.
É hora de todos nós, os heróis, irmos para casa, por que, se o fizermos, vamos perceber que não estamos sozinhos. Estamos cercados por pessoas como nós. Elas também querem contribuir, elas também têm ideias, elas querem ser úteis aos outros e resolverem seus próprios problemas.
Verdade seja dita, eles nunca quiseram heróis para resgatá-los.

Partes deste artigo são trechos do livro Walk Out Walk On: A jornada do aprendizado em comunidade – Ousar viver o futuro agora de Margareth Weatley e Deborah Frieze lançado nos EUA em 2011. Editora Berret-Koehler Publishers. Tradução de Cristiane Gantus.

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